Aleloquímicos: abordagem verde no combate às ervas daninhas
Flávia Cristina Policarpo Tonelli, Isabela Maia Pereira
Pós-graduandas do Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia (UFSJ-CCO)
v.3, n.1, 2025
Janeiro de 2025
É indiscutível a importância da agricultura para a população mundial visando a obtenção de alimentos, permitindo a sobrevivência humana. Trata-se de uma prática milenar que foi responsável inclusive pela mudança no estilo de vida dos primeiros seres humanos: de nômades a sedentários, fixando-se em um mesmo lugar, construindo assim as maiores civilizações da humanidade [1]. Além disto, é possível destacar a importância econômica desta atividade. Devido aos grandes avanços tecnológicos e aos novos métodos relacionados ao cultivo de plantas, a produção de espécies de interesse aumentou significativamente. De acordo com o Plano Diretor da Embrapa, a agricultura gera cerca de 21% da riqueza mundialmente produzida e 20% dos empregos existentes no Brasil [2].
Uma das maiores ameaças enfrentadas pela agricultura é a das pragas. Qualquer organismo capaz de causar danos aos interesses humanos pode ser incluído neste grupo. Entretanto, a maioria destes seres não causa danos diretos aos seres humanos e sua ameaça não é severa. Assim, nenhuma planta é naturalmente considerada uma praga. Porém, algumas espécies vegetais são transportadas para outras regiões e tem a capacidade de se adaptar, sobreviver, se reproduzir, produzir grande número de sementes, competindo com outras espécies por nutrientes, água e luz solar. Como resultado, estas “ervas daninhas” acabam prejudicando o crescimento de outras espécies vegetais próximas a elas. Assim, se elas crescem em meio às plantas de interesse, impedem ou prejudicam o desenvolvimento delas, sendo consideradas vilãs para a agricultura [3].
Estas “ervas daninhas” são também ricas em aleloquímicos. Trata-se de substâncias naturalmente produzidas por elas mesmas para sua proteção, capazes de influenciar o crescimento de espécies próximas, o que as permite vencer as plantas típicas de certa região quando ambas competem na lavoura. No Brasil, por exemplo, é estimado que se tenha mais de 450 espécies diferentes deste tipo de planta. Isto gerou prejuízo de cerca de US$ 104.3 bilhões de dólares de 1984 a 2009 neste país [4].
Ao longo do tempo, várias medidas tem sido tomadas por agricultores para tentar controlar o crescimento destas plantas. Alguns destes métodos são: controle biológico, controle mecânico, controle cultural, cobertura morta e uso de herbicidas. O controle biológico consiste em utilizar seres vivos, como insetos e microrganismos causadores de doenças (bactérias e fungos) para destruir a erva daninha. O controle mecânico consiste em arrancá-la, mas só pode ser utilizado em pequenas áreas. O controle cultural não traz prejuízo ao meio ambiente e consiste em rotação de culturas, ou seja, alternar as espécies cultivadas enriquecendo o solo com nutrientes necessários para o desenvolvimento da planta de interesse, ou mesmo para interromper o crescimento das ervas daninhas. A cobertura morta consiste em utilizar material como palha ou plástico para inibir o crescimento da planta indesejada. Os herbicidas sintéticos são substâncias criadas em indústrias, de ação rápida e baixo custo (Figura 1). Entretanto, podem ser tóxicas ao meio ambiente em que há a espécie que se deseja eliminar, contaminando outras plantas, animais, rios, lagos e até mesmo seres humanos. Os herbicidas estão relacionados a vômitos, alergias e, a longo prazo, câncer e Mal de Parkinson, por exemplo. Desta forma, tem se tornado essencial buscar outras medidas para o controle das espécies indesejadas cujo uso seja seguro para pessoas e natureza [5].
Figura 1: Aplicação de herbicidas em lavoura.
Fonte: https://www.flickr.com/photos/canaldoprodutor/51667343276
Neste contexto, a aplicação de herbicidas naturais tem se mostrado uma boa alternativa. Em geral, estes herbicidas são sabões, óleos, ácidos, ferro e até mesmo quelantes (substâncias que se ligam aos metais onde são lançados). São capazes de retirar a proteção da folha da erva daninha o que, com o passar do tempo, leva à morte da planta. Assim, os aleloquímicos podem ser uma escolha promissora. Cada aleloquímico tem o poder de agir sobre um determinado grupo de plantas, não tendo ação sobre outras. O termo “alelopatia” deriva das palavras gregas “allelon” que significa “uns aos outros” e “pathos” que significa “sofrimento” ou “doença”. Eles são compostos responsáveis por conferir alguma vantagem para a proteção da espécie que o produz, contribuindo para a sua sobrevivência. Podem ter uma ação positiva ou negativa sobre a planta vizinha, estimulando ou atrapalhando o seu crescimento, e podem ser produzidos em várias partes do vegetal: raiz, folha, caule e flores [6].
Apenas em meados do século XX a alelopatia ganhou atenção e foi reconhecida como uma área de estudo. Este fato se deve, principalmente aos trabalhos de Molisch e Leopold. Desde então, inúmeros estudos têm sido feitos para compreender como, exatamente, cada uma destas substâncias alelopáticas age sobre as plantas vizinhas [7].
Figura 2: Plantação de eucalipto.
Na natureza, várias espécies de plantas apresentam compostos alelopáticos. Um exemplo disso é a nogueira negra (Juglans nigra) através da produção da juglona encontrada em folhas, raízes e caules da espécie. Ela possui a capacidade de inibir o crescimento de tomates e batatas. O girassol (Helianthus annuus) também produz aleloquímicos em caules, folhas e raiz, como a helianona capaz de influenciar a sobrevivência de plantas vizinhas, assim como o eucalipto (Eucalyptus spp.) (Figura 2) [8].
Os aleloquímicos podem ser aplicados de diferentes formas. Uma forma seria cultivar plantas que os liberem, isolá-los e adicionar estes compostos em formulações que serão lançadas em ervas daninhas. As substâncias liberadas no material em decomposição são absorvidas pelas espécies indesejadas. Outra forma é a rotação de culturas: alternando o cultivo da planta que libera o aleloquímico com a espécie de interesse, evitando o crescimento de uma espécie prejudicial àquela desejada [7].
Apesar de todas as vantagens de se utilizar aleloquímicos no controle de espécies vegetais indesejadas é necessário utilizá-los com cuidado. Eles podem inibir a fotossíntese, ou seja, o processo pelo qual a planta obtém a sua energia, a absorção de nutrientes e a execução de vários processos essenciais para o vegetal. É desejável que se continue com pesquisas para proposições de soluções que aumentem a produção agrícola e que não prejudiquem a natureza [7].
Referências Bibliográficas
[1] Weells JCK et al. Life History Transitions at the Origins of Agriculture: A Model for Understanding How Niche Construction Impacts Human Growth, Demography and Health. Frontiers Endocrinology. 2020; 325(11): 1-29.
[2] Embrapa - VII Plano Diretor da Embrapa: 2020–2030. Disponível através do link: https://www.embrapa.br/vii-plano-diretor. Acesso em 05 jan. 2025.
[3] University of Arizona - Weeds. Disponível através do link: https://cales.arizona.edu/apmc/docs/11%20Weeds%20F.pdf. Acesso em: 05 jan. 2025.
[4] Adelino JRP, et al. The economic costs of biological invasions in Brazil: a first assessment. NeoBiota. 2021; 67: 349–374.
[5] Borah D. Different Methods of Weed Management. AgroScience Today. 2023; 9(4): 660-662.
[6] Zimdahl RL. Fundamentals of Weed Science. United States: Academic Press. 2018.
[7] Mushtaq W, et al. Allelopathic control of native weeds. 2022; Springer 53-59.
[8] Malaspina P, et al. Eucalyptus cinerea and E. nicholii by-Products as Source of Bioactive Compounds for Agricultural Applications. 2020. Plants. 2777(11): 1-17.